JT aplica lei nacional em ação de brasileiro contratado irregularmente para trabalhar em Angola
Depois de analisar a questão, o julgador decidiu afastar as preliminares invocadas pela empresa, admitindo a competência da Justiça brasileira para julgar a lide. O magistrado ressaltou que a empresa contratou o empregado de forma irregular, em evidente desrespeito à legislação brasileira.Pelo que foi apurado no processo, o gerente geral da reclamada tem amplos poderes de mando e age em território brasileiro, recrutando e contratando trabalhadores, designando clínica de psicólogos para entrevistas, médicos e laboratórios para exames, redigindo contratos, colhendo assinaturas dos empregados, celebrando contrato com empresa de turismo para providenciar a saída do trabalhador do Brasil e providenciando passaportes e pedidos de vistos para os trabalhadores, junto ao Consulado de Angola. A irregularidade detectada pelo magistrado está no fato de a empresa não ter autorização do Ministério do Trabalho para contratar trabalhador brasileiro em território nacional, nem a autorização do governo federal para atuar no Brasil e, ainda, não ter criado, na forma da lei, uma filial em território nacional. Nesse aspecto, o juiz entende que, apesar do descumprimento das formalidades legais exigidas, o gerente geral faz o papel de uma filial da empresa em território nacional. Isso porque o gerente demonstrou ter poderes de representação da empresa, praticando atos e assinando documentos em nome desta.
Portanto, apesar de a reclamada ser uma empresa privada de capital integralmente angolano, com sede em Angola, ficou comprovado que a contratação do mecânico ocorreu no Brasil, por intermédio do preposto da reclamada. Conforme frisou o magistrado, a realidade vivenciada pelas partes deve prevalecer sobre as formalidades e, nesse caso, a realidade mostra que, de fato, a empresa é angolana, mas tem representante brasileiro domiciliado no Brasil. E ainda que o gerente não fosse domiciliado em território nacional, observou o juiz que a conclusão seria a mesma, pois a representação em território nacional por pessoa física brasileira tem o mesmo efeito daquela exercida por pessoa jurídica brasileira.
Rejeitando a alegação de que a lei brasileira não pode ser aplicada ao caso, o julgador manifestou entendimento em sentido contrário. Ele considera inadmissível que uma empresa angolana invoque convenção internacional de direito privado da qual seu país não é signatário. No entender do magistrado, a regra da CLT sobre competência internacional deve prevalecer para a solução de conflitos trabalhistas. Explicou o juiz em sua sentença que, via de regra, a competência das Varas do Trabalho é determinada pela localidade onde o empregado prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado em outro local. Entretanto, conforme prevê o parágrafo 2º, do artigo 651, da CLT, essa competência se estende aos dissídios ocorridos em agência ou filial no estrangeiro, desde que o empregado seja brasileiro e não haja convenção internacional dispondo em contrário. Além disso, ao examinar o contrato de trabalho, o magistrado verificou a existência de uma cláusula estabelecendo que o mecânico era obrigado legal e contratualmente a retornar ao Brasil após o encerramento do contrato. Portanto, conforme reiterou o juiz, não havia possibilidade de o reclamante permanecer em Angola para propor ação trabalhista e aguardar o pronunciamento da Justiça angolana. Assim, de acordo com a conclusão do julgador, a competência para julgar o feito é da Justiça brasileira, devendo incidir, no caso, a legislação nacional.
Na ação, o reclamante postulou, dentre outros pedidos, uma indenização pela rescisão antecipada do contrato de trabalho. Ele foi contratado pelo prazo determinado de três anos, conforme autoriza a lei angolana. Entretanto, seu contrato foi rescindido quando tinha apenas um ano e 17 dias de trabalho. O magistrado salienta que a rescisão antecipada foi prejudicial ao ex-empregado, pois, certamente, ele deixou tudo que tinha no Brasil para trabalhar em outro país. O contrato longo obrigava-o perante a empresa, que, entretanto, não cumpriu sua parte e dispensou o trabalhador antes da data combinada. Pela lei brasileira, nos termos do artigo 479 da CLT, a empresa devia pagar ao reclamante a metade dos salários do tempo que faltou para completar o prazo determinado no contrato. Portanto, entendendo que esse dispositivo legal deve ser aplicado ao caso, o juiz sentenciante fixou a indenização devida, cujo valor corresponde ao resultado da multiplicação da remuneração mensal de R$ 4.200,00 pela metade do período de 23 meses e 13 dias, o que dá um total de R$47.754,00. Há recurso aguardando julgamento no TRT-MG.
Fonte: TRT 3
Nova corregedora do Conselho Nacional de Justiça diz que é comum a troca de favores entre magistrados e políticos



A ministra Eliana Calmon é conhecida no mundo jurídico por chamar as coisas pelo que são. Há onze anos no Superior Tribunal de Justiça (STJ), Eliana já se envolveu em brigas ferozes com colegas — a mais recente delas com então presidente César Asfor Rocha. Recém-empossada no cargo de corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a ministra passa a deter, pelos próximos dois anos, a missão de fiscalizar o desempenho de juizes de todo país. A tarefa será árdua. Criado oficialmente em 2004, o CNJ nasceu sob críticas dos juizes, que rejeitavam idéia de ser submetidos a um órgão de controle externo. Nos últimos dois anos, o conselho abriu mais de 100 processos para investigar a magistratura e afastou 34.
Em entrevista a VEJA, Eliana Calmon mostra o porquê de sua fama. Ela diz que o Judiciário está contaminado pela politicagem miúda o que faz com que juízes produzam decisões sob medida para atender aos interesses dos políticos, que, por sua são os patrocinadores das indicações dos ministros.
PROMISCUIDADE Eliana Calmon: " Para ascender na carreira, o juiz precisa dos políticos" E eles cobram a conta.
Por que nos últimos anos pipocaram tantas denúncias de corrupção no Judiciário?
Durante anos, ninguém tomou conta dos juizes, pouco se fiscalizou, corrupção começa embaixo. Não é incomum um desembargador corrupto usar o juiz de primeira instância como escudo para suas ações. Ele telefona para o juiz e lhe pede uma liminar, um habeas corpus ou uma sentença. Os juizes que se sujeitam a isso são candidatos naturais a futuras promoções. Os que se negam a fazer esse tipo de coisa, os corretos, ficam onde estão.
A senhora quer dizer que a ascensão funcional na magistratura depende desss troca de favores?
O ideal é que as promoções acontecessem por mérito. Hoje é a política que define o preenchimento de vagas nos tribunais superiores, por exemplo. Os piores magistrados terminam sendo os mais louvados. O ignorante, o despreparado, não cria problema com ninguém porque sabe que num embate ele levará a pior. Esse chegará ao topo do Judiciário.
Esse problema atinge também os tribunais superiores, onde as nomeações são feitas pelo presidente da República? Estamos falando de outra questão muito séria. É como o braço político se infiltra no Poder Judiciário. Recentemente, para atender a um pedido político, o STJ chegou à conclusão de que denúncia anônima não pode ser considerada pelo tribunal.
A tese que a senhora critica foi usada pelo ministro César Asfor Rocha para trancar a Operação Castelo de Areia, que investigou pagamentos da empreiteira Camargo Corrêa a vários políticos.
É uma tese equivocada, que serve muito bem a interesses políticos. O STJ chegou à conclusão de que denúncia anônima não pode ser considerada pelo tribunal. De fato, uma simples carta apócrifa não deve ser considerada. Mas, se a Polícia Federal recebe a denúncia, investiga e vê que é verdadeira, e a investigação chega ao tribunal com todas as provas, você vai desconsiderar? Tem cabimento isso? Não tem. A denúncia anônima só vale quando o denunciado é um traficante? Há uma mistura e uma intimidade indecente com o poder.
Existe essa relação de subserviência da Justiça ao mundo da política?
Para ascender na carreira, o juiz precisa dos políticos. Nos tribunais superiores, o critério é única e exclusivamente político.
Certa vez me perguntaram se eu tinha padrinhos políticos. Eu disse: "Claro, se não tivesse, não estaria aqui". Eu sou fruto de um sistema. Para entrar num tribunal como o STJ, seu nome tem de primeiro passar pelo crivo dos ministros, depois do presidente da República e ainda do Senado. O ministro escolhido sai devendo a todo mundo.
No caso da senhora, alguém já tentou cobrar a fatura depois?
Nunca. Eles têm medo desse meu jeito. Eu não sou a única rebelde nesse sistema, mas sou uma rebelde que fala. Colegas que, quando chegam para montar o gabinete, não têm o direito de escolher um assessor sequer, porque já está tudo preenchido por indicacão política.
Há um assunto tabu na Justiça que é a atuação de advogados que também são filhos ou parentes de ministros. Como a senhora observa essa prática?
Infelizmente, é uma realidade, que inclusive já denunciei no STJ. Mas a gente sabe que continua e não tem regra para coibir. É um problema muitio sério. Eles vendem a imagem dos ministros. Dizem que têm trânsito na corte e exibem isso a seus clientes.
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ORDEM NA CORTE Cesar Asfor Rocha, ex-presidente do STJ e candidato a uma vaga do Supremo: decisão serve a interesses políticos.
E como resolver esse problema?
Não há lei que resolva isso. É falta de caráter. Esses filhos de ministros tinham de ter estofo moral para saber disso. Normalmente, eles nem sequer fazem uma sustentação oral no tribunal. De modo geral, eles não botam procuração nos autos, não escrevem. Na hora do julgamento, aparecem para entregar memoriais que eles nem sequer escreveram. Quase sempre é só lobby.
Como corregedora, o que a senhora pretende fazer?
Nós, magistrados, temos tendência a ficar prepotentes e vaidosos. Isso faz com que o juiz se ache um super-homem decidindo a vida alheia. Nossa roupa tem renda, botão, cinturão, fivela, uma mangona, uma camisa por dentro com gola de ponta virada. Não pode. Essas togas, essas vestes talares, essa prática de entrar em fila indiana, tudo isso faz com que a gente fique cada vez mais inflado. Precisamos ter cuidado para ter práticas de humildade dentro do Judiciário. É preciso acabar com essa doença que é a "juizite".
Fonte: Revista Veja / edição 2184.
"O mal que se encontra no punho da espada é transmitido para a ponta."
(Simone Weil)
(Simone Weil)
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