"Tolerar a injustiça é relativamente aceitável, condenável é a intolerância da justiça". Leandro Francisco

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Ambição e poder no jogo do vale-tudo!

A ambição, regra geral, sempre foi tema de novelas, de peças de teatro, de enredos de filmes e romances. É o sentimento chave para mobilizar as grandes teias de intriga, seja a simples ambição pela valorização pessoal ao desejo de poder e riqueza. Basta que uma pessoa tenha problemas com sua auto-estima que a ambição surge como um instrumento para a obtenção do sucesso e da fama. Até na literatura sagrada podemos encontrar o registro da ambição movendo personagens e tramas. Para entender bem o que é a ambição é necessário compreender a palavra. Proveniente do latim “ambire” significa “mover-se livremente”, o que podemos entender como criar nosso próprio caminho na vida, saber o que queremos e tentar alcançar nossos objetivos.
Nada disto, no entanto, tem a ver com o que hoje entendemos por ambição, uma engrenagem no jogo do vale-tudo – mesmo pisando no outro – , uma ganância exagerada , uma neurose obsessiva. Este é o lado negro da força impulsionadora das nossas realizações, quando o desejo é cego e o ser humano perde o controle. É o desejo que passa a dominar as pessoas, tornando-se o foco principal e se transformando em egoísmo, em sinônimo de arrogância. Toda essa confusão de conceitos só faz confundir as cabeças de pessoas bem-intencionadas que querem acertar.
A humildade, por exemplo, passa a ser uma virtude facilmente manipulável. É fácil demonstrar uma humildade pública, mascarando a arrogância, dando uma visão distorcida do que é necessário para obter sucesso na vida. Humildade passa a ser a habilidade de não falar de si próprio, bem distante daquela virtude de ter coragem de ouvir críticas, aprender com os erros e aceitar outros pontos de vista. Assim, ambição não é arrogância, arrogância não é humildade e humildade não é incorporar uma personagem.
Pode-se dizer que a ambição é, pois, o desejo de crescer, de ser melhor, de se arriscar e testar seus limites. Como na vida tudo é escolha e a dualidade é presente em todas as situações, há sempre quem prefira a derrota que a vergonha de não ter lutado, de não ter aceito o caminho imposto por outro. É possível até que a ambição tenha adquirido esse conceito como o conhecemos por causa da inveja daqueles que não souberam criar o seu próprio caminho. Ambição não é apenas correr atrás do dinheiro, mas escrever seu destino sem terceirizar a própria vida. Aliás, ganhar dinheiro é a mais pobre de todas as ambições, pois isso deveria ser apenas um meio de atingir os verdadeiros objetivos.
A ética do cuidado passa então a dirigir seu foco, mais uma vez, para o egoísmo. Neste caso, a ética passa a ser o limite para ambição, imposto pela pessoa a si mesma. É tudo que ela não se permite para atingir seus objetivos. São situações que podemos definir e ensinar desde a infância, quando não aceitamos uma boa nota do nosso filho, sabendo que ele colou. Na realidade, a ética deveria ser apreendida antes mesmo que a criança entendesse o que é ambição, assim evitaríamos sonhar os sonhos que não são nossos e de não frustrarmos pelo que os outros entendem como fracasso. Entenderíamos que a persistência é importante para realizar nossos desejos e persistir é manter o foco, a firmeza de propósitos, agir enfrentando as dificuldades – mudando ou criando novas estratégias – e assumindo responsabilidades pessoais.
Talvez a mais importante tarefa dos pais seja definir, desde cedo, um comportamento ético, que permita compreender a ambição – e não a ganância – como um impulso bom, que desperta desejos, promove o desenvolvimento e estimula a superação e a perseverança. A ambição desmedida é ganância e sob este ponto de vista tudo é contrário, o comprometimento é obsessão, a perseverança é teimosia, o poder é prepotência e a liberdade é um pássaro engaiolado incapaz de entoar cantigas ao cair da tarde.

Fonte: Kleber Adorno

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