"Tolerar a injustiça é relativamente aceitável, condenável é a intolerância da justiça". Leandro Francisco

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Livro: As falhas ocultas de 12 grandes filósofos

Aristóteles apoiou o imperialismo cruel de Alexandre, o Grande (Fonte: AKG)

Esse artigo é bem interessante. Versa sobre a obra de James Miller mostrando as dificuldades de pensadores de aplicar suas ideias às suas vidas.
"‘A vida não examinada não vale a pena ser vivida’, teria dito Sócrates ao júri em seu julgamento. Ele deixou de mencionar que a vida examinada nem sempre é tão maravilhosa assim. Em 11 retratos biográficos de pensadores que tentaram seguir os passos do famoso pensador grego, e um dedicado ao próprio Sócrates, James Miller explora em seu livro “Examined Lives: From Socrates to Nietzsche” (“Vidas Examinadas: De Sócrates a Nietzsche”), o que significa seguir o chamado filosófico. Muitos problemas e incertezas parecem ser a resposta, e ele descobre que alguns dos mais famosos filósofos na verdade não eram assim tão admiráveis ou convincentes. Então é possível dizer que a filosofia é capaz de inspirar um estilo de vida? Essa é a pergunta levantada por Miller, que ensina política e estudos liberais na New School for Social Research em Nova York.
Felizmente, Miller não se concentra tanto em sua pergunta. Qualquer tentativa de descobrir uma moral abrangente com base nas vidas que ele examina teria distorcido as histórias que ele tem a contar. O que Miller nos oferece ao invés disso é uma vívida coleção de contos filosóficos que são notáveis por seu bom senso no uso de fontes, incluindo raros trabalhos de início de carreira. O resultado é um tratamento animado de assuntos que costumam ser servidos de maneira morna. Mesmo Immanuel Kant, cujos escritos foram descritos por Heinrich Heine, um poeta, como tendo “o estilo seco e acinzentado de uma sacola de papel”, emerge como uma figura bastante humana.
Se alguém quisesse compilar uma lista de acusações contra os grandes filósofos, para mostrar que eles não tinham capacidade de comandar suas próprias vidas, quanto menos inspirar outros, esse livro forneceria evidências bastante úteis. Lá estão as desastrosas negociações de Platão com o jovem Dionísio, o tirano de Siracusa, e a bajulação hipócrita de Sêneca em relação a Nero. Há relatos do apoio de Aristóteles ao imperialismo cruel de Alexandre, o Grande, que vai de encontro às ideias políticas pregadas pelo filósofo. Rousseau, que defendia a educação, abandonou seus cinco filhos, frutos de um relacionamento com uma amante de longa data, e deu desculpas patéticas para justificar seu comportamento (ele estava muito doente e pobre para ser um bom pai, e os orfanatos não eram lugares tão ruins assim para crescer).
Santo Agostinho se voltou contra o espírito do questionamento intelectual depois de ter descoberto a salvação, e sua censura dogmática criou a base para séculos de tirania intelectual por parte da Igreja Católica. Montaigne era um mestre das sugestões inconclusivas e da autocontradição. O pensamento de um místico-orador, Ralph Waldo Emerson, um admirador de Montaigne, era desconectado de evidências empíricas ou argumentos lógicos. A concepção de moral de Kant, uma rígida aderência a princípios severos surge, de certa forma, como um remédio para sua própria hipocondria. Nietzsche confessou em 1880, que sua existência era “um fardo temeroso”, embora ele estivesse, ao menos, mais feliz que antes, devido aos progressos em sua obra.
Falhas ocultas, sem dúvida; mas Miller não reprime seus filósofos à toa. A maioria deles estava, no fim das contas, cientes de suas deficiências, e não se apresentaram como profetas ou santos (exceto por Nietzsche em seus momentos de loucura). No fim de sua vida, Rousseau reconheceu que o famoso conselho do oráculo de Delfos, “Conhece-te a ti mesmo” não era tão simples de ser seguido como ele imaginava. Ele concluiu, de maneira arrependida, que era “arrogante e imprudente” de sua parte, professar virtudes que não podem ser alcançadas, e se retraiu em uma reclusão indolente.
Se Miller tivesse incluído o alegre e admirável David Hume e outras almas menos atormentadas em seus retratos, sua galeria de filósofos poderia ter um resultado final mais brilhante. Mas a conclusão em seu epílogo é provavelmente correta: o auto-exame filosófico não é uma fonte confiável de felicidade ou senso comum político. Ainda assim, existem vários filósofos, entre eles Aristóteles, que encaram a busca pela compreensão como o fim de sua jornada, não como um caminho para a alegria ou o sucesso. No fim das contas, como muitos daqueles que mergulharam na filosofia sabem, filósofos filosofam, em boa parte, porque não podem resolver os problemas."

Um comentário:

  1. Filósofos filosofam, em boa parte, porque não podem resolver os problemas.
    É vero.

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